Futebol e Cidade

Partidas de Futebol realizadas na Av. Afonso Pena, debaixo do viaduto de Santa Tereza, na Praia da Estação e na Praça  Duque de Caxias, fotos Priscila Musa.

Belo Horizonte, dia 8 de janeiro de 2012. Amanhecemos com a notícia: “Prefeitura de BH coloca campos de várzea à venda” http://www.hojeemdia.com.br/noticias/politica/prefeitura-de-bh-coloca-campos-de-varzea-a-venda-1.390737.

O Futebol é um dos esportes com a capacidade de unir, dentro e fora de campo, as diferenças sociais. É um dos mais acessíveis dos que conhecemos, pois basta uma bola, ou qualquer coisa que lembre uma esfera, para que o jogo aconteça. A esfera pode rolar em qualquer espaço, desde a rua, o quintal, as praças, embaixo dos viadutos, nos campos de várzea e até nos estádios. Diante da bola as diferenças se encontram. É a experiência de lançar o corpo em campo. Não precisamos de grandes recursos financeiros nem de aparatos como bicicletas de titânio, barcos especiais, cavalos geneticamente modificados, disso ou daquilo. Também não precisamos subir montanhas, procurar mares e rios despoluídos. Apenas necessitamos colocar a esfera para rolar, que os jogadores aparecem em campo.

Entretanto, a capitalização dos times transformou os nossos clubes de futebol em grandes empresas. Cada vez mais o recurso financeiro vira o imperativo e distancia o futebol da população de renda mais baixa, de maneira que o potencial de gerar o encontro das diferenças desaparece, dando lugar à capacidade de exacerbá-las, como é o caso da estruturação da Copa do Mundo. O evento que deveria promover o futebol como espaço de socialização, esporte de todos, acaba por agenciar o encontro de grande marcas, empresas, corporações. Além de criar um impacto urbano e social nas cidades, devido às grandes obras mal planejadas e executadas, e favorecer apenas os grandes investidores e empresas.

De fato, os pés que jogam o futebol de rua não pisarão nas arquibancadas da copa. Os mesmos pés que terão suas casas demolidas e que veem suas ruas se tornarem grandes avenidas de acesso aos estádios.

Neste panorama em que o futebol de todos vê seus gramados sendo devorados pelo futebol grande empresa, como é o caso do Campo do Clube Atlético Mineiro que virou Shopping Center,  no Bairro Lourdes, em Belo Horizonte, os campos de várzea exercem um papel fundamental. São espaços de resistência do futebol pés no chão, são indutores de vida urbana e promovem o encontro que só acontece no espaço publico, coletivo, de festa. Estreitam relações sociais entre cidadãos que raramente se encontram, como é o exemplo do Campo de Santa Tereza, um bairro de Belo Horizonte. Ali jogam bola os meninos moradores dos casarões do bairro no mesmo time sem camisa do moradores das Torres Gêmeas. Acabar com os campos de várzea não é só arrancar, com bicuda na canela, o espaço coletivo de meninos e meninas. É também pisar no joelho da vida na cidade.

A Prefeitura de Belo  Horizonte anuncia que irá vender os espaços de uso coletivo da cidade. Aos poucos, como no futebol, nossa Belo Horizonte, cidade de todos, passa a ser a cidade empresa. É por estas e outras que se escuta por toda a capital mineira um coro, digno de estádio, em rejeição a atual gestão municipal. Nosso campo Belo Horizonte não está a venda, nossas camisas não tem patrocinadores, nossa bola não tem dono e os nossos campos são de terra, cor de laranja.

Priscila Musa – Baixo Bahia Futebol Social

33 Respostas to “Futebol e Cidade”


  1. 1 Henrique Fonseca 01/11/2012 às 11:58 AM

    Ô Pri!Tenta mandar esse texto pro Juca Kfouri. Ele publica muito texto de outras pessoas,que envolvem política e esporte.
    Ótimo texto,by the way.

    -Bj.

    Henrique.

    • 2 Ana Luiza 01/12/2012 às 3:21 PM

      Está nas mãos da Itatiaia. Se a lógica for obedecida (até porque a Itatiaia tem interesse direto nisso devido à Copa Itatiaia), deve vir pancada pra cima da prefeitura em breve.

  2. 3 Enrique Marcatto 01/11/2012 às 12:40 PM

    Bem… é um pouco assustador pensar o quão sufocante está se tornando viver em uma cidade, especialmente as grandes, como é o caso de BH. É um caso de sobrevivência que hajam regras, etc, como po ex. atravessar na faixa, parar no farol…
    É preciso um pouco de racionalidade pra entender que devemos nos submeter a tais coisas, uma vez que são necessárias para que a própria cidade seja possível. Isto é, é necessário que haja o tal “mundo administrado”… Mas até o ponto que qualquer atividade mais “brincante”, que não se encaixe nos padrões de “normalidade” e “utilidade” em voga sejam impossíveis de serem realizadas? O indivíduo não pode nem mais jogar um futebolzinho (que, diga-se de passagem, pode ser até o que coloca esse indíviduo em condições de participar dessa sociedade e entender que há regras que são necessárias e importantes…).
    Esse Lacerda vai acabar criando uma bomba atômica de gente!

  3. 4 Randolfo Cavalcante de Albuquerque Reis 01/11/2012 às 1:10 PM

    OLÁ PRISCILA MUSA… PARABENS PELA MATERIA ORIGINAL…. MELHORAR EQUIPAMENTO DE FOTOGRAFIA… A LINGUAGEM FLUI, NUM TEXTO INTELIGENTE E POLEMICO…. ABRAÇÃO

  4. 5 Isa Musa de Noronha 01/11/2012 às 3:10 PM

    Essa é minha prima mui querida Priscila Musa. Grande jogadora de futebol de rua, arquiteta nas horas que sobram…..

  5. 6 Lucas 01/11/2012 às 4:48 PM

    Priscila, já viu que a sugestão do Henrique Fonseca deu certo e o Juca Kfouri publicou seu texto. Li seu texto no blog dele. Parabéns. Ficou excelente.

  6. 7 João Flávio 01/11/2012 às 4:51 PM

    Parabéns! Já estou divulgando!

  7. 8 Daniel 01/11/2012 às 4:52 PM

    Belo texto!!!

    Como seu amigo postou, eu li no Juca e dei uma passadinha para ver o original!!!

    parabéns!!!

  8. 9 Pedro Ivo Campos 01/11/2012 às 5:19 PM

    Parabéns Priscila!

    Belíssimo texto, e agora com uma projeção nacional no blog do Juca.
    O planejamento público deveria contemplar iniciativas de incentivo ao esporte. Um país sede da olímpiada não pode deixar de lado uma realidade como esta. A prefeitura de BH esta muito preocupada em concorrer com as outras cidades para ver que aparecerá mais durante a Copa do Mundo, e a câmara em esconder os escândalos de corrupção que se tornaram cotidianos.

  9. 10 Maumo 01/11/2012 às 6:08 PM

    Não conhecia seu blog. Li o texto no do Juca. Sem comentários, aliás, só um, fiquei seu fã.

  10. 11 alexandre josé 01/11/2012 às 6:33 PM

    Aqui em Joinville-SC, o cenário não é muito diferente. Temos poucos campos de várzea. A gente improvisa por amor ao esporte.

    Gostei do texto. Tomara que voce torça para o JEC aqui em SC, abraços querida.

  11. 12 Rafael Almeida 01/11/2012 às 7:04 PM

    Parabéns pelo texto.

  12. 13 Lulin 01/11/2012 às 8:33 PM

    Muito bom e pertinente seu texto. Lí no blog do Juca, gostei e passarei mais vezes por aqui.

    Ps: o estádio Otacílio Negrão de Lima, ao lado do Parque Municipal, que pertencia ao América virou supermercado.

  13. 14 Jefferson Cristiano 01/11/2012 às 8:41 PM

    Verdade…não podema acaber com a várzea…
    Sou frequentador a mais de dez anos, é um otimo espaço para socialização e participação de lazer…boa iniciativa!

  14. 15 Roberto Rodrigues Rocha 01/11/2012 às 8:55 PM

    Parabens Priscila,ótimo texto. Esta decisão é muito triste mesmo e não só sob o aspecto social e urbano, é muito prejudicial para o futebol brasileiro, que perde seu talento à medida que os campos de varzea acabam pelo Brasil afora, vide São Paulo. A varzea sempre foi o celeiro de grandes craques brasileiros, se dependermos das escolinhas de futebol, nas mãos de empresários que só vizam o lucro, nosso futuro sera medíocre. Abraços.

  15. 16 Vidigal 01/11/2012 às 11:39 PM

    Olá peço autorização para publicar o texto no blog CERVEBOLíticos.blogspot.com

    Abraços Oi!

    • 17 terrorismobranco 01/12/2012 às 9:55 AM

      Oi Vidigal!

      Não precisa nem pedir autorização, publique…Precisamos divulgar para conscientizar a população sobre essas atrocidades que ocorrem com os espaços de uso coletivo das nossas cidades.

      Beijos, Priscila

  16. 18 Fábio Magnani 01/12/2012 às 12:01 AM

    Olá Priscila, parabéns pelo texto. Esse negócio de empresa cansa. Vende isso, acaba com aquilo, destrói aquilo outro. Viva a bola, viva a vida. Abraço.

  17. 19 Adriano 01/12/2012 às 12:09 AM

    Olá Priscila, tbem tomei conhecimento do seu texto pelo blog do Juca.Parabens
    Quero partilhar com vcs a realidade de Maringá-PR, que tbem esta entregue ao interesse das gdes construtoras. Aqui chegaram ao ridículo de construir um velódromo, enquanto os skatistas de rua clamam por uma simples rampa. Detonaram o campo do estadio municipal para implantar uma pista de atletismo, ao mesmo tempo que a Universidade Estadual que fica a poucos metros dali já tem a dita cuja com os padróes oficiais. Na periferia os espaços públicos de lazer estão a mingua, e bairros super populosos são carentes de “campos de varzea” e outras áreas para a manifestação esportiva. Futebol?aqui? só pela TV.

    Professor Adriano
    Maringá-PR

  18. 20 Rodrigo Lima 01/12/2012 às 8:29 AM

    Perfeito! Essa que deveria ser a “responsável” pelo incentivo ao esporte, nos arranca a oportunidade de socializar com as demais pessoas, de incentivar a prática a saúde, acho BH uma cidade fantástica, mas conhecida com cidade dos bares… Pq não cidade do incentivo ao esporte? Não querendo comparar, mas olha o Rio, você vai ao aterro do Flamengo tem campo, quadra, tudo que vc imaginar para a prática de exercício, mas e aqui? Quantos lugares vc têm pra isso? Ta na hora de começar a mudar, incentive o exercício ao ar livre!! Viva a SAÚDE!

  19. 21 Geraldo 01/12/2012 às 8:44 AM

    Parabéns Priscila. Como morador de Belo Horizonte sei muito bem o que é isso. Daqui a pouco os espaços de convivência vão ficar restritos aos clubes pagos. Continue publicando.

  20. 22 Alessandro Meiguins 01/12/2012 às 12:01 PM

    Oi Priscila, tudo bem? Meu nome é Alessandro Meiguins, sou editor de arte da Revista FUT, do jornal LANCE. Queremos publicar teu ensaio JÁ, na próxima edição da revista. Se concordares e quiseres conversar sobre o tema, me escreva por favor no e-mail alessandromeiguins@lancenet.com.br ou no meu pessoal, meiguins@uol.com.br. Você tem mais fotos? A matéria teria 8 a 10 páginas, com textos seus sobre as fotos e sobre a proibição, podemos dar uma bela cutucada nessa situação. Abração, Meiguins

  21. 23 Juliano Nemer 01/12/2012 às 12:02 PM

    Ei priscila!
    Belo o texto e ja compartilhei.
    Me amedronta a postura da prefeitura de BH, tive outro dia a oportunidade de presenciar uma vendedora de cachorro quente ser expulsa do acostamento da praça da liberdade sem maiores explicações pelos coletes azuis. Gravei um depoimento dela mas não consegui transferir para o pc. vou ver se recupero e te passo. A exlusão social na nossa cidade é algo que para mim precede a sua existencia e encontra raízes em seu planejamento ainda no papel. Olha o que fala O relatorio do prefeito Olinto dos Reis Meirelles de 1912 ao se referir a maior quantidade da população daquela época morando fora do centro urbano limitado pela Av. do Contorno:
    “Será sempre preferível uma população menos numerosa na área urbana, porém saudável e cercada de todas a garantias de higiene, habitando prédios e áreas que tenham o conjunto harmonioso e perfeito previsto pela Comissão Construtora, a vermos mesmo no coração da cidade verdadeiros bairros chineses, habitat predileto de todas as moléstias infecto-contagiosas”. (Relatório ddo prefeito Olinto dos Reis Meirelles, 1912, apud ANDRADE, L, 2004, p.77)

    Abraço

  22. 24 Leonardo Lobato 01/12/2012 às 5:46 PM

    Linda a sua análise da importância de espaços públicos de prática de esporte e socialização nas nossas cidades!!!
    Sou do interior e minha pequena cidade “ainda” conserva nossas várzeas e praças que funcionam como você mesma diz: “São indutores de vida urbana e promovem o encontro que só acontece no espaço publico, coletivo, de festa.” Parabéns pelo texto e confesso que também fiquei sabendo pelo blog do Juca!!!

    Grande abraço!!!!
    Léo Lobato//

  23. 25 Leonardo Castriota 01/12/2012 às 10:12 PM

    Grande texto, Priscila.
    Precisamos nos mobilizar neste e em va’rios outros casos em que nossa cidade tem sido vendida e privatizada sem volta.
    Um grande abraco.
    Leonardo Castriota

  24. 26 Cris 01/13/2012 às 2:53 PM

    Incrível como um meio é capaz de disseminar uma notícia de maneira tão viral. Parabéns de São Paulo!

  25. 27 Vidigal 01/13/2012 às 2:55 PM

    Quando tiver mais “peladas” com esse cunho político, chame-nos…

    Entre lá no blog e deixa um recado ou então envie email nos convidando, ficaremos muito felizes em poder participar do ato.

    cerveboliticos@yahoo.com.br
    vidiball@hotmail.com

  26. 28 Marcos 01/13/2012 às 4:02 PM

    Parabens pelo texto Priscila! Eu o li no blog do Juca e passei aqui para conferir o original e as fotos!
    Abracos!

  27. 29 Aldemar 01/15/2012 às 8:42 PM

    Olá Priscila
    Belíssimo texto, belissima análise.
    Isso prova o quanto você está interegida no espaço urbano.
    A cidade está cada vez mais excludente não só na expulsão dos individuos de seus habitats , como também criando outros usos que tornam instrumentos de distanciamento entre o cidadão comum e as oligarquias.Onde se jogava bola, vira shopping de luxo. E isso não é só no futebol! Qualquer coisa de domínio popular é colocado para escanteio.
    Daqui a pouco o cidadadão belorizontino será exportado de sua cidade num grande processo de gentrificação.

  28. 30 Shena Mckray 01/20/2012 às 7:04 PM

    I just added this blog site to my rss reader, great stuff. Can not get enough!

  29. 31 Paulo Thiago (eng. Civil) 02/08/2012 às 12:53 PM

    Parabéns pelo texto Priscilla. Fala da realidade do momento. Gostaria de informar que um cara da prefeitura a desqualificou nos comentários do Jornal Hoje em Dia, chamando-nos de facistas e mal informados. Coloquei uma resposta à altura dele, e gostaria que você tivesse o direito de resposta contra ele.

    Futebol e Cidade

  30. 33 AR CONDICIONADO 11/27/2012 às 6:39 PM

    AR CONDICIONADO, ARES CONDICIONADO, CLIMATIZADOR, AR-CONDICIONADO


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